Se você já assistiu Doutor Estranho no Multiverso da Loucura (aproveite para ler nossa review sem spoilers e ouvir nosso podcast cheio de spoilers!), deve ter reparado no termo “incursão”.
ESTE ARTIGO TEM SPOILERS PARA DOUTOR ESTRANHO NO MULTIVERSO DA LOUCURA, NÃO LEIA SE NÃO TIVER ASSISTIDO AO FILME ANTES.
Na trama da sequência de Doutor Estranho, o ex-Mago Supremo precisa lidar com uma ameaça multiversal que bate à sua porta (quase literalmente) quando América Chavez cruza um portal para a realidade 616 (agora, o MCU usa o mesmo número que o universo dos quadrinhos — o que na verdade não faz muito sentido, mas tudo bem) enquanto foge de um monstro enviado pela Feiticeira Escarlate. Em meio a muita correria e algumas mortes, o termo “incursão” é mencionado, assim como na cena pós-créditos, com a aparição de Clea (ex-discípula e esposa dele, e atual Maga Suprema nas HQs), que afirma que Estranho “causou uma incursão” e agora precisa resolver a situação.
No filme, o conceito de incursão não é exatamente central à trama, mas tem sua importância, e por isso é razoavelmente bem explicado: é quando duas realidades se chocam, causando a destruição de ambas.
A presença da ideia de incursão numa cena pós-créditos de um filme da Marvel, normalmente o lugar usado para dar dicas do que está por vir na grande metanarrativa dessa “cinessérie”, pode ser um sinal de que estamos vendo a formação da próxima megassaga do Universo Cinematográfico Marvel.
As primeiras “fases” do MCU, apesar de terem tido cada uma delas uma função “micro”, acabaram funcionando no “macro” como uma grande construção para a “Saga do Thanos”, que culminou em Vingadores: Guerra Infinita e Vingadores: Ultimato. Os filmes às vezes pareciam peças num grande quebra-cabeças compartilhado: Onde estão as Joias do Infinito? Com quem elas estão? Quando Thanos vai conseguir pegá-las? Vários filmes terminavam com uma cena pós-créditos que não passava de um checklist para sabermos onde foi parar alguma das pedrinhas coloridas, ou onde Thanos estava naquele momento.
Com a conclusão bombástica desse arco de histórias, para alguns fãs, ficou um vazio, uma sensação de que os novos filmes estavam um pouco perdidos entre si, jogados cada um em um canto, sem nada que os unificasse em direção a um destino final.
Claro, existem algumas linhas mais ou menos claras: Viúva-Negra e séries como Falcão e o Soldado Invernal e Gavião Arqueiro apontam, talvez, para as formações tanto de um grupo de Novos Vingadores (ou mesmo os Jovens Vingadores) quanto para os Thunderbolts (ou, quem sabe, os Vingadores Sombrios), uma equipe formada por criminosos superpoderosos. Mas isso não tem a escala de uma ameaça que elimina metade da vida consciente do Universo. O fã do MCU está acostumado a criar expectativas para algum megaevento bombástico, um fenômeno social a ser comentado por anos.
E é aí que entram as incursões. Talvez.
Nas HQs, as incursões têm um papel central na fase das revistas Vingadores e Novos Vingadores capitaneada pelo aclamado roteirista Jonathan Hickman, de 2013 a 2015. Enquanto, na revista Vingadores, a equipe era reformulada para abranger uma gama cada vez maior de personagens (da Capitã Universo ao Hypérion), na revista Novos Vingadores, os Illuminati precisam lidar com a descoberta das incursões que ameaçam o Universo 616. Aqui, o grupo é formado por Namor; Homem de Ferro; Senhor Fantástico, Doutor Estranho, Raio Negro, Pantera Negra, Fera e Capitão América — este último, expulso do conselho por se opor à decisão drástica da maioria: destruir realidades inteiras a fim de salvar a deles.
Depois de uma série de acontecimentos (que envolvem até a invasão da Terra por Thanos, em Infinito), ocorre a incursão final — o choque entre o Universo 616 e o Universo 1610, o Universo Ultimate. O impacto causa a minissérie Guerras Secretas, na qual todos os universos são reescritos e fusionados num só mundo, o Mundo Bélico, sob a regência do Doutor Destino. E assim, termina a fase de Jonathan Hickman à frente dos Vingadores.
Atualmente, nos filmes e seriados da Marvel Studios, um grande destaque está sendo aplicado à ideia de multiverso, realidades alternativas, variantes de personagens conhecidos e até viagem no tempo. Esses conceitos foram introduzidos em Homem-Aranha: Sem Volta para Casa e Loki, e agora estão no título de Doutor Estranho “2”. De certa forma, mesmo WandaVision já tinha uma semente disso sendo plantada — já que, em Multiverso da Loucura, existe a explicação de que os sonhos são portas para outros universos, e Wanda tem essa visão de seus filhos (de acordo com ela) em seus sonhos, logo, eles devem existir em outras realidades. Além da formação da nova geração de Vingadores, o Multiverso é a ideia mais consistente ao longo da chamada “Fase 4” do MCU, e isso pode querer dizer alguma coisa.
Essa “alguma coisa” seria, de fato, a construção para a adaptação da saga Guerras Secretas? Sinceramente, é bem pouco provável que a Marvel Studios faça uma adaptação direta (ou mesmo indireta) de algo tão complicado quando a trama de Jonathan Hickman. É só lembrar que Guerra Civil era um megaevento que moldou toda a linha de gibis Marvel de sua época, mas no cinema, virou um pequeno passo na Saga de Thanos, e uma briga de pequena escala num aeroporto. As expectativas precisam ser ajustadas para o que a Marvel/Disney costuma entregar. Por outro lado, tanto o último filme do Homem-Aranha quanto este do Doutor Estranho são sinais de que a Disney já percebeu que, a essa altura, ela pode fazer quase qualquer coisa que os fãs quiserem, se colocar sua máquina de imprimir dinheiro para funcionar — as presenças de Tobey Maguire, Andrew Garfield, Patrick Stewart e John Krasinski são prova disso. Então, quem sabe algo próximo?
A questão aqui não é exatamente o ponto final dessas próximas fases, mas, sim, o caminho, a estrutura dessa nova “saga”. Com o Doutor Estranho sendo chamado para resolver uma incursão no campo da magia, e o próximo filme do Homem-Formiga e da Vespa prometendo também mergulhar em realidades paralelas agora numa pegada mais ficção científica, é possível que as incursões sejam as novas “Joias do Infinito”: o “McGuffin” que a Marvel Studios vai plantando ao longo de seus filmes, de modo a criar uma sensação de coesão entre suas várias obras, e a expectativa para um objetivo final.
Qual será esse objetivo final (caso o que especulei aqui seja verdade, claro), é difícil saber. Pode, quem sabe, ser uma adaptação beeeeeem livre de Guerras Secretas, mas pode ser qualquer outra coisa, também — sei lá, até Terra X pode desempenhar algum papel nessa jogada, considerando a importância dos Celestiais e dos Eternos nessa minissérie das HQs.
Além disso, a saga Guerras Secretas foi utilizada pela editora para reorganizar suas linhas de histórias. Foi assim que ela acabou com a linha Ultimate e trouxe personagens queridos de universos alternativos para o mundo principal, como Miles Morales e o Velho Logan. Com as estreias oficiais das propriedades intelectuais que a Disney recuperou comprando a Fox, no caso, o Quarteto Fantástico e os X-Men, talvez seja assim que o MCU introduza esses núcleos em sua série principal — apesar de o “timing” não bater exatamente (quanto tempo eles nos enrolariam até colocá-los definitivamente nas telas?) e algumas dessas escolhas terem que ser feitas de forma muito cuidadosa, porque podem prejudicar as mensagens centrais de suas histórias, principalmente com os mutantes, que podem se tornar personagens muito mais fracos narrativamente se eles forem forasteiros de outro mundo, em vez de uma nova raça que surgiu no nosso.
Por enquanto, claro, é tudo especulação. Só o que há de concreto é: 1) O Doutor Estranho precisa resolver uma incursão; 2) A “Quantumania” de Homem-Formiga e a Vespa vai adentrar o “mundo quântico” e continuar a mexer com o Multiverso; e 3) Loki terá uma segunda temporada. Logo, tem muito multiverso por aí. Resta saber se ele será o centro ou a margem da metanarrativa do Universo Cinematográfico Marvel.
The post Como a Marvel pode ter encontrado sua nova “Saga do Thanos” nos cinemas appeared first on Geek Here.