Num dado momento do capítulo 1 de Mashle, o personagem principal do mangá, o Mash, vê pessoas servindo comida usando varinhas e magia, levantando pratos e copos no ar e tudo mais, e diz “Tudo coisa que dá pra fazer com as mãos, pra variar”. É esse tipo de humor seco e idiota que dita a comédia do mangá — e é por isso que eu adorei.
Mashle é um mangá publicado na Shonen Jump desde 2020, de autoria de Hajime Komoto, e que acaba de ser lançado pela Panini aqui no Brasil. A ideia não é complicada: pense no mundo de Harry Potter — magia, varinhas, escolas de magia, etc. Mas, aqui, o Voldemort venceu, e os “trouxas” foram caçados até praticamente não existirem mais. O Mash é um garoto que não pode usar magia, por isso seu “avô” adotivo o esconde no meio da floresta, e o faz praticar musculação para se defender. A questão é que o menino virou praticamente o One Punch-Man com tanto treinamento — e agora, ele vai entrar para a academia de magia e tentar se tornar o “Visionário” (o melhor aluno do ano) na porrada.
Sabe quando você para por 2 minutos pensando em Harry Potter e chega à conclusão de que dava pra vencer o Voldemort com certa facilidade se as pessoas em Hogwart tivessem conhecimento do advento da arma de fogo? Pois é, Mashle parece todo construído em volta dessa premissa. Todas as melhores piadas são em momentos em que o Mash olha para os magos fazendo suas bobagens com magia e diz “Pra que fazer a mesa surgir do chão e a prova cair do céu? Era só levar a gente pra uma sala com as provas já no lugar”. E eu simplesmente me acabo de rir nesses momentos. Não são as piadas mais inteligentes que existem, mas com o timing certo, funcionam perfeitamente bem.
Basicamente, metade das piadas de Mashle.
Elas também funcionam por conta do protagonista. O Mash é um personagem muito carismático. É quase como se o autor tivesse misturado o Saitama de One Punch-Man com o Shigeo de MOB Psycho 100. É a junção das piadas de OPM, com um personagem bizarramente forte ganhando lutas com facilidade, com a inocência do “Mob”, já que ele é só um menino bacana e meio tapado que não entende metade das situações em que ele se encontra. Mesmo assim, essas características adicionam algumas camadas a mais a ele. Ele é, na superfície, apenas uma grande piada ambulante, mas já temos alguns sinais de que ele pode ser um pouco mais que isso. Existe até o ótimo momento em que ele diz que, se ele não puder alcançar seu objetivo simples de viver uma vida em paz com o avô, a única alternativa é “destruir esse mundo na porrada”. É mais uma piada com seu modo bruto de pensar, mas também é uma camada de acertividade violenta que o deixa mais interessante.
Claro, existe um outro lado para ele, mas que, estranhamente, acaba fazendo sentido. Em certos momentos, o Mash se mostra um tanto assustador, quase como se pensasse como um assassino. Mas é uma extensão do modo de pensar dele para tudo: da mesma maneira que ele vê um labirinto e só sai andando em linha reta quebrando as paredes, ele também diz ao vice-diretor que “Você pode me expulsar, e eu posso te enterrar no chão, e aí?”
Curiosamente, o personagem não sai dessa como alguém antipático, já que ele é retratado como apenas um moleque meio “lerdo”, mesmo — além de bem-intencionado e obviamente injustiçado.
Essa característica da injustiça e do preconceito desse mundo ainda não foi totalmente explorada no primeiro volume, que se concentra nos primeiros dias do Mash na escola, e em como ele é vítima de perseguição pelo “Draco Malfoy” da história por ser esquisito, mas não exatamente por não ter magia (já que ninguém percebeu ainda — o que é outra ótima piada recorrente da história). Afinal, o que aconteceu no mundo de Mashle foi, efetivamente, uma limpeza étnica. Isso será abordado na trama? No Japão, o mangá está entrando em seu arco final, mas como não li além deste volume 1, não posso afirmar com certeza. Eu chutaria que não. Não me parece o tipo de coisa que ajudaria este mangá, sinceramente. A não ser que ele seja convertido a um “shonen de luta”, à la Reborn — o que torço para que não aconteça. Já basta o já citado One Punch-Man sendo confundido com um épico shonen em vez da comédia besta que é.
Meu único receio em relação a Mashle é: quanto tempo até cansar? As piadas recorrentes, até aqui, são ótimas. Tanto a força absurda dele quanto o pensamento raso e o fato de ninguém ter percebido que ele faz tudo na base da força em vez de magia, tudo isso rende muitas risadas… nestas primeiras 200 páginas. A chave para este tipo de história é, ou criar novas piadas recorrentes, ou achar maneiras de desmembrar e expandir as que já existem. Será que ele consegue?
Como já citado acima, o mangá já está se encaminhando para o encerramento, o que, para mim, é um ótimo sinal — um sinal de que o autor entende que não precisa arrastar essa mesma piada pra sempre. Porque Mashle: Magia e Músculos é um mangá idiota. Deliciosamente idiota. É um divertimento, até aqui, descompromissado, calcado no carisma do elenco e na escalada do absurdo e do nonsense. O começo é promissor. E, se ele não vai ficar marcado para sempre como um grande clássico da Jump como um Dragon Ball ou One Piece da vida, que pelo menos seja lembrado como uma pequena joia oculta pra ser recomendado a quem esteja atrás de uma leitura diferente.
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