A série da Ms. Marvel, a essa altura, é um amontoado de boas ideias com uma execução nada inspirada. Os dois episódios iniciais parecem outra vida, outro seriado completamente. Esta reta final aposta em um drama familiar que tem lá seus momentos de sucesso, mas esbarra em uma produção capenga e diálogos rasteiros e básicos, para dizer o mínimo.
No episódio passado, fomos deixados com o cliffhanger da Kamala viajando no tempo através de seu bracelete, direto para o dia da partida dos trens na Partição entre Paquistão e Índia. Aqui, Ms. Marvel volta um pouco mais, e conta a história de Aisha, bisavó da Kamala e “clandestina” neste universo, anos antes da Partição. E essa é a única parte que funciona no episódio todo.
A história de Aisha é básica mas é minimamente eficiente. Mais uma vez estabelecendo um paralelo entre a Partição (que inclusive, conta com uma explicação bastante didática, o que é obviamente muito legal e positivo, principalmente levando em consideração o público alvo) e a trama dos clandestinos interdimensionais, a bisavó da Kamala está no futuro Paquistão tentando achar uma maneira de voltar, mas conhece Hasan, e com ele, cria uma família. É uma história sobre encontrar novos lares e novas raízes a partir da família — e fazer com que o drama da partida da Índia se entrelace com a perseguição e pressão da Najma é até uma jogada inteligente.
Mas não passa disso. Os últimos momentos de relativa qualidade são as cenas em que os Hasan e Aisha se separam na confusão do embarque, e depois Hasan perde a pequena Sana (não sei se a homenagem já estava nas HQs ou não, mas o nome vem de uma das criadoras da Ms. Marvel, a editora Sana Amanat). Depois disso, chegamos ao momento do final do episódio passado, e tudo desanda.
Porque, o que poderia ser um momento emocionante, de pontas soltas sendo ligadas e catarse emocional, se perde numa direção sem energia nem criatividade. Descobrimos que o tal momento do “caminho de estrelas” que a bisavó infame da Kamala criou para salvar a filha na confusão do embarque dos trens foi, na verdade, uma ação da própria Kamala, viajando no tempo — ou melhor, a Kamala ajudou sua avó Sana, ainda criancinha, a usar o bracelete e encontrar o pai. Legal, não? Pois é. Podia ser. Se a cena não fosse a coisa mais sem graça do mundo, um borrão marrom mal enquadrado com quatro ou cinco pontinhos brilhantes no ar.
Essa é só a primeira cena com efeitos especiais constrangedores, porque logo depois temos mais uma. Quando Kamala volta ao presente, Najma também acorda e vê que o “véu” se abriu, e eles podem voltar à própria dimensão. Mas eis que, quando um dos clandestinos tenta passar, ele é… cristalizado (?) até sobrar só os esqueletos, que depois evaporam, numa cena com efeitos especiais dignos dos Mutantes da Record. Tudo bem que é um seriado de streaming, e que o orçamento para eles é bem menor que de um lançamento mundial nos cinemas, mas nós precisamos acreditar que Ms. Marvel se passa no mesmo universo de Vingadores: Ultimato, sabe… inclusive, isso é parte integral da composição da personagem. A diferença de qualidade não podia ser tão gritante. Se eles de fato trocaram os poderes da Kamala porque as mãos de borracha dela ficariam feias em CGI, olha, o que eles colocaram no produto final em vez disso estão pior que a encomenda.
Mas nada disso seria exatamente insuportável se o roteiro e as performances compensassem, e isso, em Ms. Marvel, já foi perdido faz tempo. Como falei na review do episódio anterior, todo o elenco da trama super-heroica está muito canastrão, o que já deixa tudo complicado, mas agora, nem o núcleo familiar se salva. Os diálogos da reconciliação entre Kamala e sua mãe ao fim do episódio ficaram muito falsos, quase um teatro escolar bem ensaiadinho. Claro, é difícil atuar com naturalidade com um texto tão pedestre e descritivo quanto o desses diálogos finais. Todos os personagens declaram, bem explicadinho, uns para os outros, os seus sentimentos e como eles estão sendo resolvidos. É muito bobo.
E não são só os diálogos. A própria resolução da trama é toda muito esquisita. O que exatamente estava acontecendo com o véu? Por que ele estava destruindo quem tentava passar? Temos que simplesmente pressupor que é um surto de energia fora de controle e pronto? E o que Najma fez ali? Como ela fechou o véu e passou seus poderes para o Kamran? O que está acontecendo?! Todas essas perguntas vão ser deixadas sem resposta, porque, mais uma vez, um seriado Marvel do Disney+ enrola no meio para depois ter que resolver tudo apressadamente no fim.
E, num toque final de pressa desnecessária, o episódio termina numa cena de explosão que quase corta uma fala no meio, de modo muito esquisito. Parece quase um erro de edição, como se tivessem esquecido de colocar a cena seguinte e tivessem mandado o episódio com alguns segundos de tela preta antes dos créditos por engano. Além disso… a trama principal já foi encerrada, não? No penúltimo episódio? A trama que podia ser a grande catarse emocional da série se resolve (muito mal, mas se resolve) antes do fim, e o que temos agora é a subtrama da Controle de Danos a ser concluída.
Suponho que a ideia agora seja ligar mais Ms. Marvel ao resto do Universo Cinematográfico Marvel. Vejamos como isso será feito. Mas, seja lá o que façam, este seriado já não tem mais muita salvação. Foram dois episódios que nos enganaram, seguidos de uma queda de qualidade vertiginosa. Realmente uma pena.
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