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Primeiras Impressões | Spy x Family: uma produção virtualmente perfeita

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Seria necessário um esforço proposital para deixar Spy x Family ruim. A obra original é simplesmente uma delícia (já comentei no meu podcast), a adaptação ficou nas mãos hábeis dos estúdios Wit e Cloverworks e do diretor Kazuhiro Furuhashi, que fez um ótimo trabalho em Dororo. O anime já estava com um status de destaque da temporada antes de sua estreia. A expectativa sempre foi alta — e o esforço para alcançar essa expectativa é evidente no episódio 1. A questão é onde foi alocado esse esforço.

Em Spy x Family, o superespião Loid Forger precisa se infiltrar no país inimigo e acessar um importante político, que nunca aparece em público a não ser em eventos da escola megatradicional que seu filho frequenta. Para isso, Loid precisa forjar uma família e matricular um filho na escola. Ele adota uma menina, Anya, que o dono da casa de adoção nunca gostou, porque ela é “esquisita” — na verdade, Anya é uma telepata, resultado de experimentos secretos. Logo, Loid precisa lidar com mais uma vida enquanto cumpre sua missão, sem saber que sua “filha” sabe que ele é espião, o que para ela é o máximo, porque ela adora desenhos de espionagem.

Uma característica do mangá que continua no anime é o fato de que o plano de fundo da trama de espionagem nunca é exatamente o foco, e o fato de isso não ser nenhum problema. Com o tempo, algumas coisas vão ficando mais claras, obviamente — principalmente a questão cultural daquele país, uma sociedade muito centrada na ideia de aparências e tradicionalismo. Mas as dicas disso já estão aqui, sendo a primeira a própria cena de abertura, na qual a operação do Loid consiste em proteger o segredo da careca de um político, trabalhando a dicotomia aparências vs. transparência. Ao fim do episódio, isso volta, com a escola exigindo que a família tenha uma mãe, ou seja, a exigência de uma formação familiar tradicional. O que é usado muito mais para evocar a temática da série (espionagem, disfarces, segredos), mas não chega a ser importante (por enquanto) na prática. Não é uma história de espionagem “de verdade”, não é um “procedural” de espião. A ideia aqui é outra.

Uma das ideias centrais da série é assistirmos essa formação da família “Forger” (com esse nome nada sutil), principalmente a abertura emocional do Loid — e isso está perfeito nesta estreia da versão animada. A direção faz um ótimo trabalho em deixar os momentos mais “fofinhos” com a sensibilidade necessária, e esse início de transformação do Loid (assim como sua hesitação) fica bastante claro quando vemos como ele começa — dispensando uma namorada de maneira absolutamente fria, porque ela não é mais “útil” — e como termina — comemorando com sinceridade o sucesso da menina no “vestibulinho” da escola, a ponto de baixar a guarda e ficar fraco porque soltou toda a tensão acumulada na operação.  E, claro, a Anya está tão lindinha quanto o esperado, e se ela não funcionasse, toda a empreitada caía por terra.

…e é aí que começa o problema. Porque, veja bem, a produção deste primeiro episódio é de cair o queixo. A trilha sonora deixa tudo hiper “cool”, numa pegada de jazz que remete até a um Baccano, por exemplo. A fotografia cria um ambiente quase atemporal para aqueles países fictícios, algo que pode mais ou menos ser localizado nos anos 40~50 do nosso mundo, mas banhado às vezes por um entardecer que isola aquele lugar num tempo que nunca existiu. O design de personagens está simplesmente impecável, todos eles são muito expressivos e nunca se acha um frame sequer de desenho abaixo da média. A animação está ótima, principalmente quando a ideia é criar uma cena de ação, como a luta no final do episódio, o que é importante para passar a sensação de que Loid é, de fato, um agente quase perfeito. Então, existe um trabalho extraordinariamente eficiente em fazer com que a série seja cool, emocionante e tocante.

Mas faltou deixar engraçado. É difícil definir em palavras mas Spy x Family é um mangá hilário. E muito disso é o maravilhoso uso da Anya, a melhor personagem do mangá, disparado. O fato de ela saber de tudo e isso deixá-la tão empolgada quanto ansiosa para fazer tudo certo — já que a “paz mundial” depende dela, no entendimento de criança que ela teve do que ouviu na mente do pai — gera todas as melhores passagens da obra, principalmente porque o humor de Spy x Family é um misto de bobo com seco.

Mas no anime, parece que a direção estava tão preocupada em fazer a melhor produção do ano que esqueceram de dirigir como uma comédia. As piadas estão lá, mas, sem o timing de comédia, a sensação que fica é muito parecida com assistir uma sitcom sem a claque de risada — é difícil identificar que são piadas. Boa parte das piadas nesse início de série se dá por meio da Anya lendo a mente do pai e tentando se adaptar, ou percebendo que o pai está “mentindo”. E todas elas parecem menos piadas e mais comentários passageiros. Quando ela ouve que entendê-la é a chave para salvar o mundo e começa a explicar que gosta de amendoim, a direção e a edição não dão o tempo de respiro e o foco necessário para que identifiquemos que aquilo é engraçado. Ela só… fala. É estranho.

O que é uma pena, porque com alguns ajustes, o anime seria basicamente perfeito. Talvez seja uma questão, mais uma vez, de expectativa. Ou talvez seja porque já li o mangá, e por isso já conhecia as piadas? É difícil saber (e é mais uma prova de que críticas são subjetivas — a minha verdade não é a mesma que a sua, leitor, e está tudo bem). Mas é realmente uma pena que  Spy x Family tenha muito mais me impressionado do que exatamente me divertido.

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