Primeiras Impressões | A Couple of Cuckoos: Um anime médio de 2002 perdido no tempo

A suspensão de descrença é um acordo que fazemos com toda ficção que experimentamos. Nós olhamos para uma obra de ficção e dizemos “ok, eu acredito num pirata que estica” ou “tá, esse bilionário vai se vestir de morcego pra fazer o bem durante a noite, claro…”, mas em troca, nós queremos alguma coisa. Uma ideia que nos instigue, imagens que nos cativem, um mistério, uma mensagem, seja o que for.

A Couple of Cuckoos está aí para testar esse nosso acordo. Ele quer que acreditemos que um garoto certinho de 16 anos descobre que foi trocado na maternidade e que aquela não é sua família de verdade; não fica exatamente muito abalado com a notícia; marca um encontro casualmente com a família biológica e, no caminho, tromba com a garota trocada por ele no hospital (uma celebridade de internet conhecida por ser absurdamente linda) sem saber que era ela; eles passam por altas aventuras juntos alheios a esse fato; e quando ele chega ao tal encontro, as duas famílias já haviam concordado que a melhor maneira de lidar com a situação seria casar as duas crianças.

É uma premissa 100% idiota, tirada diretamente das piores fanfics rocambolescas que se vê por aí (não quero perpetuar o mito de que “fanfic = ruim”, mas elas têm o hábito de arranjar desculpas meio estapafúrdias para juntar dois personagens). Se é pra gente acreditar em algo do tipo, eu preciso que o anime compense de alguma forma. E é com nenhuma surpresa que eu devo dizer que A Couple of Cuckoos não tem muito mais que isso a oferecer.

Premissas absurdas não são exatamente um problema — existe uma infinidade de maneiras de fazer isso funcionar. Você pode levar completamente a sério e fazer um drama tão bom que o espectador vai passar por cima da ideia inicial. Pode fazer uma comédia nonsense que se aproveita da idiotice. Pode pegar no dramalhão e fazer um “shoujo dos anos 70” novelesco. A abordagem de A Couple of Cuckoos é criar uma espécie de “sub-Love Hina”. É como se este anime tivesse sido lançado em 2002, completamente esquecido pelo público, e uma TV japonesa tivesse pegado as fitas e colocado de novo no ar por engano, e estamos todos achando que é um anime novo.

É complicado assistir A Couple of Cuckoos quando se tem animes tão bem produzidos na mesma temporada, como Spy x Family ou Dance Dance Danseurou outras opções de comédias românticas como Shikimori’s Not Just a Cutie (que eu nem gosto de verdade) ou My Dress-up Darling da temporada passada (que eu gosto um pouco mais), opções que não só têm textos melhores (…em níveis variados, digamos) como não ofendem meus olhos. Porque este anime aqui é muito sem graça. As cores são básicas e chapadas, os designs de personagem não têm nenhuma inspiração, sempre apostando na escolha mais previsível possível, e a animação por vezes parece a de um desenho educativo de baixo orçamento.

A direção também não ajuda: os enquadramentos mais óbvios que se pode usar nesse tipo de história, uma montagem em loja de roupas logo no primeiro episódio, o tipo de tomadas cômicas e expressões que já vimos em milhares de animes diferentes, tudo isso contribui para que A Couple of Cuckoos pareça mais do mesmo, um anime qualquer.

Mas a questão é que a equipe de produção do anime, ao que parece, já não tinha um material dos melhores para trabalhar, já que o roteiro mesmo da coisa é muito ruim. O problema já começa nos personagens principais, Nagi Erika, que não têm um pingo de carisma e não passam de colchas de retalhos de características necessárias para que as cenas de sempre, de toda comédia romântica, aconteçam. A naturalidade com que Nagi parece aceitar a situação toda é completamente surreal. Depois, o fato de ele simplesmente se deixar levar por uma menina que ele nunca viu na vida e fazer toda aquela aventura no dia em que ele ia conhecer os pais biológicos, uma experiência que deveria mudar sua vida, é um negócio irreal; ou melhor: é irreal porque o personagem ainda não foi completamente formado, se é que um dia será — se o roteiro o tivesse construído de forma que ele fosse uma pessoa que tomaria esse tipo de atitude, até seria verossímil, mas o personagem é um nada, até aqui, então fica difícil de entender.

Depois disso, é só uma sucessão de bobagens, desde a cena em que ele a defende de stalkers (precisa se provar um homem!), passando pela doideira que é o encontro no restaurante (que, mais uma vez, seria palatável se os pais fossem usados como um recurso de comédia nonsense, mas os pais biológicos do Nagi parecem pessoas razoáveis, e não dois malucos, então vai saber) até, claro, chegarmos à Formação de Harém Express, com a tal rival do Nagi na escola e depois… é claro… a irmã que se liga que o Nagi não é irmão dela “de verdade”, logo “hm, quem sabe, hein…??”

A Couple of Cuckoos é uma produção média, com uma premissa batida e absurda, um roteiro pedestre e nenhum personagem cativante o suficiente para fazer com que tudo isso valha a pena. Assista por sua conta e risco, mas eu vou ficar por aqui mesmo.

► Fique ligado aqui no Geek Here porque toda sexta-feira, às 13h30, na Twitch do Portal, rola o programa TEREBI, onde eu comento os animes da semana!

The post Primeiras Impressões | A Couple of Cuckoos: Um anime médio de 2002 perdido no tempo appeared first on Geek Here.

Related posts

TLOU: vazam as primeiras imagens de Ellie e Dina na 2ª temporada

Versões do Windows 10 terão suporte encerrado em junho; entenda

Funcionários da Apple podem fazer 1ª greve da empresa em cidade dos EUA